Brasil vive uma ‘epidemia de obesidade’

O Brasil vive atualmente uma escalada preocupante da epidemia de obesidade. Dados recentes do Ministério da Saúde revelam que, entre 2006 e 2023, a proporção de adultos com obesidade mais que dobrou, saltando de 11,8% para 24,3% — um aumento de 72% em 13 anos. Para os especialistas que participaram de audiência pública na Comissão de Esporte (CEsp), nesta quarta-feira (30), os números escancaram a necessidade urgente de se criar uma política pública robusta e intersetorial para combater o avanço da doença e, ao mesmo tempo, incentivar práticas de prevenção que reduzam o sedentarismo. O debate foi requerido (REQ 4/2025) pela presidente do colegiado, senadora Leila do Vôlei (PDT-DF).

Ainda segundo dados do Ministério da Saúde, o cenário é mais alarmante entre os brasileiros atendidos nas unidades básicas de saúde: de um universo de 24,78 milhões de adultos com estado nutricional avaliado, 67,71% estão com excesso de peso e 33,25% já convivem com obesidade. 

A coordenadora de Alimentação e Nutrição do ministério, Kelly Poliany de Souza Alves, destacou que a obesidade não é um problema isolado, mas o resultado de uma rede complexa de fatores que envolvem cultura, condições socioeconômicas, ambientes escolares e de trabalho, e políticas públicas — ou a ausência delas. “A prática de exercícios e o combate ao sedentarismo são apenas uma das frentes dessa rede”, afirmou.  

A coordenadora defendeu ainda que o enfrentamento da obesidade seja articulado com pautas como a reforma tributária, a regulamentação da alimentação escolar, a regulação da publicidade de alimentos ultraprocessados e o desenvolvimento de uma política eficiente de segurança pública, garantindo ambientes seguros para o lazer e a prática de atividades físicas.

Pandemia silenciosa

O representante do Conselho Federal de Medicina (CFM), Bruno Leandro de Souza, disse que a obesidade se caracteriza hoje como uma pandemia silenciosa que ameaça o futuro das novas gerações. Ele esclareceu que a doença é classificada como crônica, tratável e incurável e se apresenta como um fator de risco para o acometimento de outras doenças crônicas. “É um problema gravíssimo de saúde pública no Brasil que há pouco não era nem enxergado como se fosse algo tão importante de ser discutido, porque se colocava a culpa no próprio paciente ou na população, a pessoa obesa, como se fosse ela a culpada da sua obesidade, e não é assim. Se nós não fizermos e caminharmos juntos na tentativa de ajudar, de combater o problema ele vai só se agravar”, ponderou. 

De acordo com Bruno Souza, em 2010, pouco menos de R$ 1 bilhão era investido no Sistema Único de Saúde (SUS) em ações de prevenção ou de cuidados da obesidade. Atualmente esse valor é de R$ 2 bilhões, sem contar com o que é direcionado às doenças crônicas não transmissíveis. 

O presidente do Conselho Regional de Educação Física da 7ª Região, Roberto Nóbrega, concordou com o médico. Ele afirmou que se não for feito “nada de imediato”, há uma previsão para os próximos anos de que 135 milhões de brasileiros estarão nesse quadro de sobrepeso e obesidade. O sobrepeso e a obesidade estão relacionados a várias patologias que podem levar a um gasto enorme na área de saúde.

Como sugestão para ampliar a política pública de prevenção através da prática de exercício, Roberto Nóbrega defendeu a dedução de gasto com esse tipo de serviço na declaração do Imposto de Renda e o investimento em campanhas educativas. 

Cultura do movimento

A inatividade física também se destaca como um dos principais fatores agravantes da obesidade no Brasil. Conforme o Ministério da Saúde, entre adolescentes de 13 a 17 anos, menos de 40% afirmaram ter praticado atividades físicas no ano da última pesquisa, feita em 2019. O índice é ainda mais crítico entre meninas, das quais 85% não cumprem as horas semanais recomendadas de exercício. Além disso, uma em cada três crianças brasileiras está acima do peso ideal.

Para a vice-presidente do Conselho Regional de Educação Física da 1ª Região, Eloisa Vilela de Souza, é preciso combater a “pandemia do sedentarismo com a cultura do movimento”, principalmente a partir da educação e no ambiente escolar com políticas preventivas de saúde. 

Eloisa destacou dado do Ministério da Saúde, de 2019, que aponta que 54,7% dos óbitos no Brasil são causados por doenças crônicas não transmissíveis, sendo 30% doenças cardiovasculares. Para ela, muitos desses quadros poderiam ter sido revertidos através da prática de exercícios físicos aliada a uma boa alimentação. 

A conselheira ainda enfatizou a importância de se manter, pelo menos, cerca de 150 minutos de atividade física moderada por semana, o que equivale a, pelo menos, 20 minutos por dia. Conforme dados do IBGE de 2017, 51% dos brasileiros entrevistados informaram que não praticam exercício físico por falta de tempo, enquanto 20,3% justificam a inatividade por problemas de saúde ou idade avançada e 13,9% informam não gostar. 

Incentivo à prática orientada

O Brasil é atualmente, segundo o presidente presidente do Conselho Federal de Educação Física (Confef), Claudio Augusto Boschi, o segundo país no mundo com maior quantidade de estabelecimentos para a prática de atividade física e atividades recreativas. 

Entre as ações defendidas pelo conselho, o presidente citou o incentivo e apoio ao aumento de prática esportiva nas escolas, atrelar a prática de exercícios cada vez mais a uma das medidas essenciais para promoção da saúde mental e tornar o programa de Academia da Saúde, com unidades espalhadas em bairros e comunidades, uma política pública efetiva para tornar o projeto uma política de Estado e não de governo. 

Ele ainda defendeu o reforço da capacitação de meninos e meninas atletas para que eles sejam elos com as suas comunidades locais e gerem, cada vez mais, o sentimento de pertencimento, além da valorização dos profissionais de educação física capacitado para coordenar essa orientação.